domingo, 19 de junho de 2016

Política nacional

Um cidadão duplo

Por Janio de Freitas
 
A esquecida ou ignorada cidadania italiana de Eduardo Cosentino da Cunha, brasileiro descendente de imigrantes de Castellucio Inferiore, passa a ter uma importância judicial não prevista, contra uma utilidade previsível por seu detentor. É o primeiro efeito da iminente decisão do ministro Teori Zavascki sobre as restrições à liberdade de Cunha, da prisão à tornozeleira eletrônica, a pedido do procurador-geral Rodrigo Janot.
 
Em princípio, amanhã começa o prazo de cinco dias dado pelo ministro para apresentação de defesa por Eduardo Cunha. Na Câmara, seu tempo disponível para manobras é ainda razoável. Mas no Supremo Tribunal Federal, entre sua defesa e a decisão sobre o pedido de Janot, é questão de dias. E, como o pedido incluiu a "apreensão do passaporte", mesmo se referindo apenas ao brasileiro, isso indica, é claro, preocupação com possibilidade de fuga. Para a qual, a ocorrer, o uso provável seria o do documento italiano, não do brasileiro. Mas não consta indício de intenção fugitiva de Cunha, a não ser o estreitamento do círculo que o ameaça.
 
Ao contrariar, por insuficiência de motivação, as prisões de José Sarney, Renan Calheiros e Romero Jucá, o ministro Zavascki expôs um conceito quase como um recado: "A prisão preventiva representa simplesmente uma antecipação da pena, o que tem merecido censura pela jurisprudência desta Suprema Corte, sobretudo porque antecipa a pena para acusado que sequer exerceu o seu direito constitucional de se defender". Daí, além da lembrança a certos praticantes de prisão como prioridade, o novo prazo dado à defesa de Eduardo Cunha.
 
A dupla cidadania é uma condição que Eduardo Cunha sempre evitou mencionar. Compreende-se. Apesar de suas sucessivas façanhas, é uma figura pouco desvendada. Quando se lançou candidato à presidência da Câmara e publiquei, aqui mesmo, o problema e os riscos que sua eleição traria, muitos me fizeram perguntas porque o ignoravam de todo. O jornal mesmo não se interessou pela importância do tema. E pode-se supor que não tem sido muito diferente com a Lava Jato. Como uma das pessoas mais informadas há muitos anos e ainda hoje, para isso valendo-se de qualquer meio, não será surpreendente que Eduardo Cunha saiba mais sobre cada integrante da Lava Jato do que os integrantes, somados, saibam dele.
 
Corroboram tal hipótese uma suposição e uma constatação. A primeira: seria estranhável que Eduardo Cunha, dispondo de segunda cidadania pouco ou nada conhecida, não a utilizasse para artifícios em operações financeiras no exterior. A outra: não consta ação alguma da Lava Jato direcionada para a verificação de contas, investimentos e transações por meio da cidadania italiana de Eduardo Cunha. Bem, não consta nem sequer menção da Lava Jato à segunda cidadania. Se não houve quem dela falasse em troca de benefícios, lá ela inexiste. O que é ainda mais exótico por outro motivo.
 
A batida na moradia de Eduardo Cunha esmiuçou até as peças de roupa dele e de sua mulher nos armários, como provou o papel recolhido em bolso, sobre um deputado. Outro achado foi uma cópia parcial de passaporte italiano do deputado. Indicação suficiente para muita investigação posterior. Disso, porém, não há notícia. O cidadão italiano tem a paz que o cidadão brasileiro perdeu.

Fonte: www.jornalggn.com.br

Opinião

Dunga, apenas um dos culpados

Um novo vexame foi protagonizado pela seleção brasileira de futebol, que foi desclassificada na fase de grupos da Copa América Centenário, realizada nos Estados Unidos da América.

Ainda na fase de grupos do torneio, o Brasil empatou sem gols com o Equador (embora tenha sofrido um gol legal, anulado pela arbitragem), iludiu-se com uma vitória por sete a um contra a inexpressiva seleção do Haiti e perdeu de um a zero para o frágil selecionado do Peru.

Há décadas o Brasil nem perdia para o Peru nem era eliminado na fase de grupos de uma Copa América, realizada em 2016 em edição extraordinária em razão do  aniversário de cem anos da Confederação Sul-Americana de Futebol – Conmebol.

A eliminação precoce do mais importante torneio de futebol da América fez cair o enfadonho técnico Dunga do comando do escrete canarinho, caindo com ele toda a sua equipe de trabalho, inclusive Gilmar Rinaldi, que deixou de ser o coordenador de seleções da Confederação Brasileira de Futebol – CBF.

Dunga, certamente, pode ser apontado como o principal culpado por mais esse fracasso brasileiro dentro das quatro linhas. Nunca deu padrão de jogo ao time, deixou de fora dele jogadores de maior habilidade técnica (como o lateral esquerdo Marcelo, do Real Madrid, por exemplo), não fazia em jogo oficial as tempestivas e necessárias substituições quando a equipe jogava mal, parecia não ter comando absoluto sobre os jogadores, somente vencia amistosos contra adversários fracos e raramente vencia jogos oficiais, deixou o Brasil no sexto lugar de classificação das eliminatórias para a Copa do Mundo de 2018. Enfim, como técnico de futebol ainda é uma lástima.

No entanto, Dunga não pode ser apontado como o único culpado por esse desastroso enredo da seleção brasileira. Há mais pessoas e instituições com induvidosa culpa por tudo isso, e talvez até mais grave do que o raivoso Dunga.

O erro para que o nosso futebol tenha caído em descrédito mundo afora vem de longe. Começa fora do campo.

Primeiramente, há de se ter em mente que a Confederação Brasileira de Futebol  - CBF é um clube fechado de um grupo que manda e desmanda há décadas, desde os tempos em que ela era a Confederação Brasileira do Desporto – CBD.

Responsável por gerir o futebol brasileiro e a nossa seleção, a CBF vive envolta numa cortina de ferro, somente vazada quando por outros meios se tem notícia dos escândalos de corrupção que marcam a entidade. Isso é tão sério que um ex-presidente da entidade foi preso pela Polícia na Suíça, juntamente com outros cartolas do futebol mundial, e o seu atual presidente nem viaja ao exterior, por medo de também ser preso, porque também é citado em escândalos de corrupção que envolvem não apenas a CBF, mas também a própria Federação Internacional de Futebol Associação – FIFA.

Essa estrutura arcaica, conservadora e nada transparente da CBF é a mesma das Federações estaduais internas que lhe dão corpo, comandadas por grupos tradicionais, formados por pessoas que, na sua quase totalidade, nunca jogaram uma partida de futebol na vida, mas que não largam o osso de forma alguma.

São os dirigentes dessas Federações estaduais que elegem os diretores da CBF, e nesse convívio de troca de interesses, o que mais interessa são o poder pelo poder, o lucro das competições e a manutenção de tudo exatamente como está hoje. Futebol de qualidade, isso não interessa nem à CBF nem às suas filiadas Federações estaduais.

Os clubes de futebol também são culpados por nosso momento ruim no maior esporte do País. Eles são filiados às Federações estaduais e nunca se rebelaram contra estas, exceto um caso aqui e outro acolá ao longo de décadas. São os representantes dos clubes que elegem os dirigentes das Federações, que por sua vez elegem os dirigentes da CBF.

Os clubes não se entendem nem entre si, pois às vezes seus dirigentes – muitos extremamente amadores – agem como torcedores e deixam que a rivalidade do campo – própria das torcidas – motive suas decisões, que deveriam ter como escopo principal o bem do futebol brasileiro, pois, melhorando este, todos sairão ganhando.

Além disso, os clubes de futebol do Brasil são, em regra, mal gerenciados, mais das vezes dirigidos por políticos que querem apenas promoção para suas carreiras, outras vezes comandados por pessoas que não têm a mínima noção de administração de uma entidade, outras vezes conduzidos por quem realmente só quer tirar proveito da situação.

Com raríssimas exceções, os clubes de futebol brasileiro atrasam o pagamento de salário de seus atletas e funcionários, têm dívidas com o INSS e a com Receita Federal e não cumprem várias outras obrigações.

Na ânsia de mostrarem resultados imediatos às suas exigentes torcidas, fazem verdadeiras loucuras financeiras, contratando jogadores já rodados mundo afora por valores astronômicos, absolutamente fora da realidade desses clubes.

Vejamos o caso exemplificativo do Botafogo, que se afundou em dívidas após pagar por um ano salários mensais de cerca de setecentos mil reais ao holandês Clarence Seedorf, e que desde então não dispõe de recursos para montar um time competitivo.

Outros exemplos atuais mostram o desperdício de dinheiro que se paga a alguns medalhões do futebol, que nem produzem mais tanto assim dentro de campo. São salários mensais de quinhentos mil reais, setecentos mil reais, e por aí segue.

Nos clubes, também não se tem uma continuidade de trabalho. Os treinadores são mudados a cada sequência de maus resultados e os times são diferentes a cada temporada. Não dá nem tempo de a torcida se acostumar com um plantel, e no ano seguinte já se tem outro.

Outro culpado pelo fracasso do nosso futebol e da nossa seleção é o calendário anual elaborado pela CBF juntamente com as Federações e, de certa forma, com a cumplicidade silenciosa dos clubes. Como sempre se tem em andamento várias competições oficiais, aqui se joga invariavelmente duas vezes por semana, muitas vezes havendo a necessidade de grandes deslocamentos num País que tem dimensões continentais.

O mesmo calendário privilegia alguns clubes, dando-lhe a oportunidade de jogar o ano inteiro, em detrimento de uma enorme maioria, que só tem compromissos oficiais em praticamente metade do ano.

Esse calendário, de certa forma, também é imposto pela televisão que compra os direitos de transmissão das partidas de futebol, principalmente a Rede Globo de Televisão, que induvidosamente dita as regras do nosso calendário de futebol.

Para atendimento às exigências da Rede Globo, estádios ficam vazios em jogos realizados perto das dez horas da noite das quartas-feiras, porque a torcida, composta em sua imensa maioria por trabalhadores mais simples que acordam cedo para trabalhar – excetuando-se aí os bandidos que compõem as organizadas -, não tem como fazer deslocamentos de meia hora ou uma hora, ou até mais, para ir de casa ao estádio em plena quarta-feira à noite, para depois chegar em casa já na quinta-feira de madrugada para logo depois ter que sair para trabalhar.

Estádios vazios significa prejuízo aos clubes, o que contribui para o estado de insolvência de todos eles.

Os culpados pelo fracasso do nosso futebol não estão apenas fora das quatro linhas, no campo burocrático. Dentro de campo ou à beira dele também temos fatos e situações que nos ajudam a compreender o porquê de  o nosso selecionado nacional ter se tornado um grande fracasso.

Nossos treinadores ou técnicos de futebol, chamados pelos atletas de professores, não seguem os exemplos dos professores da sala de aula e não se reciclam. Acham que, por serem técnicos do futebol brasileiro, não precisam mais renovarem suas lições e seu pensamento sobre o futebol.

Pedantes, nossos técnicos de futebol assistem aos vizinhos treinadores argentinos se consolidarem como grandes treinadores mundo afora. Na última Copa América realizada no Chile, em 2015, das oito seleções classificadas às quartas-de-final, cinco tinham argentinos em seus comandos. Na Copa América Centenário, realizada nos Estados Unidos da América, os argentinos também se fizeram presentes em grande número no comando de seleções de países diversos, além do seu, logicamente.

Na Europa, até o ex-volante argentino Simeone, de estilo retranqueiro, tem conseguido sucesso dirigindo o Atlético de Madrid. Tem levado este clube relativamente pequeno da Europa – se comparado aos grandes nomes – a posições importantíssimas, tendo inclusive participado recentemente de duas finais da Liga dos Campeões da Europa, certamente o mais importante torneio de futebol de clubes do Velho Continente.

Levados pelas cifras surreais do futebol chinês, nossos treinadores foram trabalhar no continente asiático, num País em que o futebol ainda está longe de ser praticado num nível ao menos razoável. O homem do sete a um para a Alemanha, Luiz Felipe Scolari, o multi-campeão brasileiro Wanderley Luxemburgo e o também destacado Mano Menezes foram dirigir clubes chineses. O detalhe importante é que os três já dirigiram a seleção brasileira de futebol.

Mas, como resultado do nosso fracasso técnico no futebol, ao menos dois deles já foram mandados embora pelos chineses, no caso Mano Menezes e o “pofessor” (assim mesmo, como ele fala) Wanderley Luxemburgo, que dirigia um time da segunda divisão do futebol chinês.

Isso significa dizer que o nível técnico dos treinadores brasileiros está tão ruim que nem a China quer mais.

Ainda como causa do nosso fraco desempenho nas quatro linhas temos a falta de investimentos e de aperfeiçoamento das nossas categorias de base. Nossos clubes já não formam tantos talentos. As estruturas físicas dos clubes são precárias para os jogadores da base. O nível técnico, de seu turno, também fica a desejar, pois muitas vezes vemos jogadores recém-saídos da base que não sabem executar fundamentos simples do futebol, não havendo mais tempo para um aprendizado consistente depois que eles se tornam profissionais.

Juntando a falta de investimentos na base com a crise financeira dos clubes e a desorganização destes, nos últimos anos o que temos assistido é uma revoada de jogadores brasileiros para o exterior sem mesmo passarem pelos times profissionais de seus clubes.

Esses atletas são vendidos antes de atingirem a maioridade civil e, tão logo completam dezoito anos vão embora para começarem as suas carreiras profissionais fora do Brasil. E então são moldados a jogarem um futebol diferente, que não é o nosso. Quando são convocados para a seleção brasileira, são brasileiros apenas em razão do nascimento nesse torrão, mas não jogam como jogavam nossos brasileiros de outrora.

Até o final dos anos oitenta e início dos anos noventa do século passado, nossos atletas do futebol somente eram vendidos para a Europa e para outros continentes depois dos vinte e tantos anos, quando já haviam passado pelas equipes profissionais de seus clubes e quando já haviam dado a estes muitas alegrias, com vitórias e títulos. Agora, porém, a força do capital estrangeiro compra nossos atletas ainda na base. Por sinal, muitos brasileiros dentre os que jogam lá foram são até desconhecidos do povo brasileiro que gosta de futebol.

A maioria desses jogadores emigrantes tem como destino a Europa, que tem um futebol muito competitivo. Outra parcela importante, porém, vai jogar na China, nos Emirados Árabes e noutros mercados onde o futebol ainda principia e não tem qualquer competitividade. O pior é que, mesmo assim, muitos dos jogadores que atuam nesses mercados periféricos são convocados para vestir a camisa da seleção brasileira, onde o nível técnico exigido deve sempre ser o maior possível. Vêm por indicação de quem?

Por outro lado, se antes éramos respeitados por nosso estilo próprio de futebol, de muita arte, muito talento e muita ofensividade, atualmente nossos técnicos fazem questão de querer copiar o estilo lá de fora.

Houve uma inversão de valores, e há quem, noutras terras, queira aplicar um estilo de jogo que antes nós víamos por aqui. Tomemos como exemplo Josep Guardiola, ou Pep Guardiola, espanhol que fez sucesso como jogador e que agora brilha como técnico de futebol. Várias vezes campeão como técnico do Barcelona, da Espanha, e do Bayern de Munique, da Alemanha, ele agora irá dirigir o Manchester City, da Inglaterra.

Às suas equipes, Pep Guardiola, que se rende em elogios ao futebol que o Brasil jogava em décadas passadas, do século passado, aplica esquemas táticos e estilos de jogo nada convencionais, sempre inovadores, mas com muito talento, com muita variedade de jogadas e principalmente com muita ofensividade. Foi assim no Barcelona, foi assim no Bayern e provavelmente será assim no City.

Se é verdade que Pep Guardiola muito se inspirou no estilo de jogo implantado por Johan Cruyff, jogador que comandou o famoso Carrossel Holandês nos anos 70 do século passado e que também foi vitorioso como treinador do Barcelona, também é verdade que ele se utiliza de lições do futebol brasileiro do século passado. Essa sua admiração pelo futebol brasileiro de antigamente já foi declarada publicamente por Guardiola em várias entrevistas.

Enfim, perdemos a identidade no futebol. Nosso selecionado nacional é um bando de jogadores desarrumados em campo sem qualquer brilho, sem qualquer vontade, sem qualquer comando, sem qualquer referência. Estão ali só por estarem, e nem fazem muita questão por isso.

Nossos jogadores estão mais preocupados com as fortunas que lhes pagam os clubes lá de fora, e até mesmo com a imagem de cada um, e menos preocupados – ou com nenhuma preocupação – com a seleção brasileira. Já não existe aquele entusiasmo ou aquele orgulho de ser chamado a vestir a camisa amarelinha.

Riquinhos de vida feita, nossos atletas do futebol que são chamados à seleção nacional desconhecem o que um dia foi o futebol brasileiro. Carregam dentro de campo muito estilo nos cabelos, muitas tatuagens – nada contra quem as usa -, muita pose, chuteiras coloridas, porém pouco futebol, ou pelo menos pouca vontade de demonstrarem um bom futebol.

Nosso maior nome na atualidade, Neymar Júnior, tem muita bossa, arrogância, vaidade excessiva e pouco futebol pela seleção brasileira. É um craque, sem dúvidas, mas seus maiores e melhores atributos de jogador estão apenas a serviço do Barcelona, onde ganha tubos de dinheiro e para quem parece sempre se preservar.

Na verdade, parecem existir dois Neymar: um do Barcelona, autor de lances e jogadas incríveis, jogador solidário na marcação e taticamente comprometido; e outro da seleção, que aparece só para ostentar para o mundo a sua condição de melhor jogador do Brasil e, sempre que lhe deixam à vontade, para falar asneiras e coisas sem nexo.

Neymar não faz nem tanta questão de jogar pela seleção brasileira. Na Copa América do Chile, em 2015, fez de tudo para ser expulso e assim ficar de fora da competição, pois vinha de final de temporada na Europa e desejava aproveitar as suas férias. Que se danasse a seleção nacional.

Noutros jogos oficiais, Neymar toma cartão com facilidade, até ser suspenso ao menos por um jogo, para mais uma folga. Agora, na Copa América Centenário, não fez qualquer gestão junto ao Barcelona para que fosse liberado pelo clube catalão para participar do torneio.

Em suma, para Neymar, tanto faz como tanto fez estar ou não jogando pelo Brasil.

Enquanto isso, uma mídia alucinada, à procura de um ícone, brada aos quatro cantos que Neymar é o cara, que será o próximo ganhador do prêmio Bola de Ouro da FIFA, que é um talento excepcional, etc. etc. etc. E isso faz desbordar o ego do jogador, ainda rotulado por alguns de “menino”, quando já não o é há muito tempo.

Pretenso intocável – a ideia de intocabilidade pessoal é própria dos arrogantes -, Neymar quis estender essa “imunidade” aos seus colegas de seleção brasileira. Após a eliminação vergonhosa na Copa América Centenário, chamou de babacas jornalistas, cronistas esportivos e os brasileiros que emitissem críticas ao grupo de jogadores que foi eliminado nos Estados Unidos da América. Ainda bem que o craque Rivelino respondeu à altura: “Neymar, o babaca é você”.

Esses jogadores atuais do Brasil devem olhar para o passado, mais distante e mais próximo, para compreenderem que o selecionado nacional precisa de jogadores com a garra e o empenho de Pelé, Garrincha, Marinho Chagas, Rivelino, Sócrates, Zico, Falcão, Romário, Bebeto, Ronaldo Gaúcho, Ronaldo Nazário, Rivaldo, Cafu, Roberto Carlos e outros, para poderem jogar pelo escrete canarinho.

Se nem todos terão o talento dos craques do passado, e jamais terão o talento de Pelé e Garrincha, que pelo menos se doem à seleção brasileira como aqueles fizeram. Não raramente, jogadores como Romário e Ronaldo Nazário andavam em baixa em seus clubes mas jogavam muitíssimo bem quando estavam na seleção nacional. Isso já faz a diferença.

Como se vê, o erro pelos últimos fracassos da seleção brasileira de futebol não foi só de Dunga. Muitos erraram, inclusive a CBF errou duas vezes quando primeiro ofereceu o maior cargo do futebol brasileiro para que ele, Dunga, tentasse aprender ali o ofício de treinador, dando mais uma oportunidade quatro anos depois para que ele, Dunga, continuasse seu “estágio” de técnico de futebol justamente à frente da seleção.

Dunga também errou, duas vezes, ao aceitar um encargo para o qual não estava preparado.

A CBF também errou ao nomear Gilmar Rinaldi no cargo de coordenador de seleções. Gilmar, depois que deixou de ser jogador, passou a agenciar jogadores, ganhando muito dinheiro como empresário de atletas. A sua nomeação para o cargo não foi bem vista por ninguém em sã consciência. Foi ato no mínimo imprudente, para não se dizer outras coisas.

Para que o Brasil volte a ter um futebol de alto nível, respeitado, muito precisa ser feito. A nomeação de Tite para o cargo de técnico da seleção é apenas um ponto benéfico dentro do que precisa ser mudado. Mas ela anda longe de ser a solução para os muitos problemas do nosso futebol e do futebol da nossa seleção.

Embora nossos clubes não tenham nem onde treinar, por não terem centros de treinamento em sua maioria, hoje temos uma estrutura de estádios de causar inveja. Mas estádios modernos não ganham jogos. O Chile não os tem, mas anda jogando um futebol de alto nível, sendo inclusive o campeão da Copa América de 2015 e o representante da América do Sul na Copa das Confederações de 2017, que acontecerá na Rússia.

Infelizmente, a mais eficaz das medidas para que se possa melhorar o futebol brasileiro não acontecerá, pois, para que tenhamos empenho nas quatro linhas, precisaríamos ter moralidade absoluta fora dela. Mas isso exige a saída imediata de todos os cartolas da CBF e das Federações estaduais, todos envolto numa grande nuvem de escândalos e de manutenção do poder a qualquer custo. Isso não acontecerá!

Sem essa limpeza geral dentro dos postos de quem comanda nosso futebol, continuaremos com paliativos para a melhora dele, e já será um lucro enorme se a seleção nacional conseguir uma vaga para a Copa do Mundo que acontecerá na Rússia em 2018.

Ah, mas não somos uma vergonha no futebol mundial sozinhos. Nesta Copa América Centenário, o Chile derrotou o México por sete a zero nas quartas de final. Dois pontos, porém, merecem destaque: o técnico da equipe, Juan Carlos Osorio, assumiu de pronto a responsabilidade pelo fracasso e não ficou com evasivas; e, diferentemente do México, que nunca ganhou uma Copa do Mundo e sequer foi a todas elas, o Brasil é pentacampeão mundial e é o único país a participar de todas as Copas do Mundo de futebol.

Alcimar Antônio de Souza