O momento é de dor
Não sou parente nem o
conheci há tanto tempo atrás ao ponto de poder dizer que era um grande amigo
seu. Mas, de amigo, posso chamá-lo sim. Na verdade, eu era mais um dos muitos
cidadãos que, vez por outra, iam à agência do Correio de Patu em busca de
serviços ali oferecidos. Fui também mais um dos milhares de cidadãos que sempre
foram muitíssimo bem tratados por Arni Praxedes de Melo, servidor público
desses que enchem de orgulho qualquer órgão ou repartição.
Jeito sereno, sorriso
fácil, atendimento respeitoso, urbanidade à flor da pele. Era esse o modo de
trabalhar de Arni, que cativava a todos que chegavam ao Correio de Patu em busca
de atendimento. E não se esforçava para isto. Simplesmente agia assim,
naturalmente.
Antes mesmo do
lastimável episódio que ceifou a sua vida nesta manhã sombria de quinta-feira,
24 de abril, eu já ouvia na cidade de Patu comentários e mais comentários
acerca da postura ética, correta e exemplar de Arni Praxedes. Quem o conhecia
mais de perto não perdia a oportunidade de realçar as suas virtudes, que eram
muitas: de pai exemplar, de marido dedicado à esposa e à família, de servidor
público escorreito, de homem temente a Deus, obediente aos ditames do Pai
Celestial.
Esse atestado de
idoneidade moral, passado informalmente por quem conhecia Arni Praxedes, é
ponto de consenso entre os patuenses, afinal, nunca ouvi de ninguém, antes ou
depois de sua morte, qualquer comentário negativo a respeito de sua conduta,
mesmo tendo ele enveredado num passado recente no minado campo da política,
onde valores morais às vezes são jogados facilmente na lama. Mas nem lá Arni
foi contaminado.
É pena que certas
conversas não temos quando estamos todos vivos. Particularmente, eu não tinha
toda essa intimidade para puxar com ele esse tipo de assunto. Também não dava
tempo. Geralmente eu o encontrava no atendimento do Correio, ou aos domingos à
noite pelo centro da cidade, quando o via chegando ao templo religioso da
Assembleia de Deus, ou de lá saindo, vagarosamente, com a mansidão de quem
acabara de falar com Deus.
No atendimento do
Correio também não havia tempo nem ambiente propício para uma conversa mais
franca e mais amiga. E nem precisava, pois Arni sabia respeitar e conquistar
amizades, e era também sabedor que o respeito e a conquista de um amigo
acontecem reciprocamente entre pessoas de bem.
Se os algozes de sua
vida o conhecessem minimamente como eu e tivessem no coração ao menos um por
cento da retidão de caráter de Arni, certamente o teriam poupado da morte e teriam
evitado tanto sofrimento à sua esposa, aos seus filhos e aos seus muitos
amigos.
Não à toa, mas por
irrestrita e profunda solidariedade à dor dos familiares de Arni, a cidade de
Patu passou esta quinta-feira em absoluto silêncio, numa tristeza coletiva rara
de se ver. E assim entrou pela noite. Nas redes sociais virtuais, as mensagens
de solidariedade e de tristeza se multiplicaram rapidamente.
Também nas redes
sociais, uns poucos se arriscaram a apontar culpados. O momento, entretanto,
não é propício a julgamentos esparsos e muitos deles até desarrazoados. O
momento é de dor, de tristeza, de angústia e também de revolta, de sabermos que
um cidadão exemplar teve a sua trajetória interrompida pela ação desumana de
alguns animais que usam indumentárias de humanos, mas que são
verdadeiros bichos selvagens.
Culpados indiretamente
pela morte de Arni, existem alguns, sim, como a Empresa de Correios, que não se
previne contra os corriqueiros furtos e assaltos às suas agências porque
recebe de volta de alguma seguradora aquilo que lhe foi furtado ou roubado,
em total desprezo aos serem humanos que lhe dedicam uma vida de trabalho; ou
como o Estado, responsável pelo serviço de segurança pública, que está falido
em todos os quadrantes do seu território, por absoluta falta de atenção do próprio Estado.
Os culpados diretos,
aqueles que cometeram tamanha atrocidade, estes talvez fiquem sem identificação
para a sociedade e certamente aumentarão as estatísticas da impunidade, que
estimula outros meliantes a fazerem o mesmo e impõe medo aos cidadãos de bem.
Mas, como dito, não entremos
nessa discussão, que nesse momento em nada diminuirá a dor e o sofrimento que
laceram os corações dos familiares e amigos de Arni Praxedes. A hora é de nos
juntarmos a essa dor, como de fato assim vem fazendo a população patuense, que
consegue neste instante amordaçar a sua inquietude e a sua revolta numa
expressão mais simples de tristeza e abatimento.
Tristeza e abatimento,
por sinal, foram expressões que nunca presenciei na face de Arni Praxedes nas
vezes que fui por ele atendido naquela agência do Correio. E é esta imagem de
Arni, de alegria natural e de contentamento espontâneo, próprio das pessoas de
bem, que levarei comigo.
A você, Arni Praxedes,
resta desejar que o Senhor Deus lhe receba de braços abertos no Reino do Céu,
cujos caminhos – imaginamos – foram por você trilhados por toda uma vida, vida esta construída
à base do respeito, da correção do agir, do amor à família e, principalmente,
da obediência ao Pai.
Descanse em paz.
Alcimar Antônio de
Souza
Nenhum comentário:
Postar um comentário